O verdadeiro jornalismo investigativo, sem cunho sensacionalista, deveria ser devidamente valorizado, pois quem sairia a ganhar era o cidadão pelo qual os meios de comunicação deveriam estar, constantemente, em guerra. Seria uma luta pela verdade pela justiça e pela democracia.
Esta é uma das grandes temáticas que eu considero presentes no filme para mim selecionado, Broadcast News. Subjacentes a esta, encontramos a ética como barreira entre profissionalismo e amizade, o interesse público, os valores-notícia ou a procura de objetividade e veracidade dos factos.
O jornalismo já deu ao cinema vários e grandes filmes e, em todos os géneros, até na comédia.
Broadcast News é um filme de 1987 produzido e dirigido por James L.Brook.
Segundo alguns críticos, Brook não só conseguiu vários prémios com este filme, numa época em que os meios de produção eram escassos, como também conseguiu ser realista e direto.
O filme pode ser visto como uma suave e divertida comédia romântica pelo tom divertido que predomina ao longo do filme, mas “quem quiser vê-lo como uma séria discussão sobre princípios, sobre ética no jornalismo, terá todos os elementos para isso”.
O tema é sério: princípios e valores éticos, ambição, a realização e frustração profissional, o trabalho em equipa e a competição dentro da equipa.
Nos Bastidores da Notícia mostra-nos o mundo competitivo dos bastidores da Washington Network, habitado por jornalistas ambiciosos e prontos para tudo.
No departamento jornalístico desta emissora estabelece-se de imediato um triângulo jornalístico-amoroso, cujos vértices são: Jane, uma competentíssima produtora, Aaron um repórter brilhante, produtor de conteúdos informativos para telejornal e, finalmente, Tom, atraente e fotogénico, mas que não passa disso.
Ambos, Aaron e Tom, vão disputar Jane. Esta, que a princípio manifesta desagrado pelo tipo de trabalho produzido por Tom (este conhece técnicas e truques de postura televisiva a ponto de conseguir recriar sentimentos; graças aos seus dotes físicos atinge sucesso como pivot), acaba por se apaixonar por ele e por ajudá-lo a atingir o sucesso televisivo.
Boadcast News evidencia a questão da televisão privilegiar a imagem em prol da transmissão séria e neutra da informação, isto é, privilegia o estilo em lugar do conteúdo. Tom representa o tipo de apresentador de televisão de “notícias de entretenimento” que Jane despreza. Ele encena as suas reportagens, recorrendo à emotividade e não à espontaneidade. Não é sincero na apresentação do seu trabalho e acaba por infringir a ética profissional. Exemplo disso, é a gravação de uma reportagem acerca da violência nas relações amorosas efetuada por Tom, em que este puxa a lágrima e encena totalmente uma expressão de pesar, já depois da gravação e do relato da vítima terem sido gravados.
Tom consegue alcançar êxito como pivot do telejornal e como repórter, não graças às suas competências intelectuais, mas sim à sua vocação para a representação. É um bom ator que consegue convencer o seu público através da emotividade, da representação de sentimentos que parecem naturais e sinceros.
Jane é sensível e admite perante Tom que lhe agrada numa reportagem o estilo emotivo, mas essa emoção tem de surgir naturalmente, não pode ser forçada nem ensaiada. Para ela uma reportagem tem que transmitir a realidade dos factos e tem de ser natural. O repórter não deve influenciar ou modificar a realidade que pretende transmitir ao público.
Jane, além da eficiência e da celeridade, procura ser isenta e imparcial no trabalho que faz. Estas características conferem-lhe o estatuto de boa profissional e a promoção no meio televisivo onde trabalha.
Tom alcança, igualmente, estes valores mas através do caminho oposto. A sua eficiência é obtida através da encenação e da representação, do artifício. O seu mérito não provém nem da inteligência nem da sinceridade, mas sim da sua apresentação física e da sua capacidade para ludibriar os telespectadores.
Ambos alcançam êxito profissional através de caminhos diferentes. Tom mais ligado à representação dos factos e Jane mais ligada à apresentação dos factos.
Apesar das visíveis diferenças entre Jane e Tom, a determinada altura ela acaba por se apaixonar por ele e essa paixão ser tornar correspondida. Mas as diferenças acabam por ser tão acentuadas que não conseguem deixar de interferir na relação e de ser o mote da separação deles. Jane passa a desconfiar dos verdadeiros sentimentos e intenções de Tom em relação a ela e aos outros, à sua prestação profissional.
Mais importante do que saber por quem bateria o coração da irreverente, independente e criativa Jane (embora com momentos de fraqueza em relação à sua vida pessoal), para James Brook é a questão dos princípios.
Como vimos, o realizador não opta pela saída mais simples e mais óbvia. Verifica-se uma divisão clara entre o jornalismo sério e o jornalismo sensacionalista.
Sobre este tema gostaria de citar as seguintes palavras de Marcondes Filho, “No fundo a imprensa sensacional trabalha com as emoções, da mesma forma que os regimes totalitários trabalham com o fanatismo, também de natureza puramente emocional… As notícias assim apresentadas transformam os fatos sociais em diversão … Buscam puramente o esvaziamento da crítica do jornalismo. Com eles, realiza-se o ato de omitir mostrando, de preencher o tempo com nada, de concretizar o esvaziamento cultural”.
Bourdieu sobre este assunto refere: “… o tempo é algo raro na televisão e se minutos tão preciosos são empregues para dizer coisas tão fúteis, é que essas coisas tão fúteis são, de facto, muito importantes na medida em que ocultam coisa preciosas”.
Podemos afirmar que em Broadcast News é motivo de reflexão a questão da separação entre o que é news, notícia séria, e o que é infotainment, mistura de informação com entretenimento.
Esta temática pode ser comprovada através de duas passagens do filme: o momento em que Jane impede que o cinegrafista (na América Central, na cobertura da guerrilha entre sandinistas e “contras”) desse ordens a um guerrilheiro para calçar uma bota para que ele pudesse filmar a cena. Para Jane este gesto seria uma mentira.
Também, Aaron critica Tom num diálogo com Jane, acusando-o de espetacularização e sensacionalismo na sua forma de fazer jornalismo e na forma como atua perante as câmaras.
Hoje, no mundo inteiro a informação é constante e veloz. Com o avanço tecnológico, as notícias chegam às pessoas quase instantaneamente. E uma vez introduzida a notícia na agenda noticiosa do dia, a televisão tem a capacidade de dar conta, em direto, de todos os desenvolvimentos que subsequentes, criando pelas imagens um forte efeito de presença, na consciência dos destinatários que não é comparável a nenhum outro meio noticioso. O jornalismo moderno deixa muito a desejar, provocando o despreendimento. A perceção e a reflexão, antes indispensáveis, deixam de ser importantes nesta vertigem do direto juntamente com a voragem de captar audiências. O que importa nesta era capitalista é lucrar.
Broadcast News transmite o ambiente que se vive numa estação televisiva e também mostra a que tipo de remodelações pode estar sujeita uma empresa deste género. A determinada altura, a empresa onde trabalham as três personagens principais sofre uma transformação e muitos dos seus colaboradores são despedidos. Jane e Tom fazem parte do grupo das poucas pessoas que acabam por sair beneficiadas com a mudança. Estes dois são promovidos. Aaron não teve tanta sorte quanto os outros dois. Apesar de não ter sido dispensado foi despromovido. Foi-lhe proposto trabalhar mais por menos dinheiro.
Para além das relações amorosas e profissionais, das aptidões pessoais e profissionais das personagens e o jornalismo das hard news/sensacionalismo, o filme foca ainda as estratégias empresariais que ocorrem, também , no setor da televisão.
Para a correta prática do jornalismo, todos os jornalistas devem ter consciência que é necessário exercer a profissão de forma ética e deontológica.‘’O jornalista deve relatar os factos com rigor e exatidão e interpretá-los com honestidade…o jornalista deve assumir a responsabilidade por todos os seus trabalhos e atos profissionais, assim como promover a pronta retificação das informações que se revelem inexatas ou falsas…’’
Tom enquanto entrevistava a mulher vítima de violações, tinha uma só câmara direcionada para ela. No decorrer da conversa acharam conveniente ele ter lágrimas nos olhos e Tom, num ato de interesse, com a câmara a filmá-lo simula que chora, desrespeitando a profissão, os valores que se impõem e a confiança dos espectadores.
Mais tarde, quando confrontando com a verdade, Jane alerta-o que pode ser despedido por atitudes como aquelas ao que ele argumenta que foi promovido por momentos como aquele.
Este filme demonstra, também um lado do jornalismo muito bem desenvolvido, que é a luta que existe entre o sensacionalismo e a busca da total verdade de um acontecimento, isto é, o jornalismo de investigação.
O realizador fez questão de valorizar e relembrar à sociedade da verdadeira e antiga definição do jornalismo, juntamente com o papel árduo e corajoso do jornalista. Fez também sobressair o sentido de oportunidade que o jornalista pode vir a ter, se tiver coragem de arriscar. Mas o principal ponto de atenção é o conceito de jornalismo de investigação, onde o jornalista procura mostrar à sociedade todos os elementos verdadeiros de um acontecimento, apoiando-se a 100% nas fontes e na relação que mantém com elas.
Este filme apresenta-nos fenómenos clássico do jornalismo como as relações de desconfiança entre profissionais, mas também de solidariedade e de corporativismo.
Os princípios éticos são fundamentais para nortear as ações das pessoas num mundo que se pretende justo e pacífico.
Estes princípios e práticas estão “esquecidos” nos dias atuais. Este é o momento propício para se debater a favor da ética. Não se trata de uma questão de moral nem restrita à educação. A ética está acima da moralidade, é um valor inerente aos direitos e deveres dos cidadãos. Um valor não nasce por geração espontânea, como dizia Aristóteles, adquirimo-lo por exercício.
Em tempo de democracia a comunicação tem um papel determinante: é ela que permite ao jornalismo ser o que é hoje, uma vez que a liberdade de expressão é um direito e uma garantia que nos assiste.
São discerníveis dois caminhos: o do bom jornalismo, comprometido com a verdade, e o do jornalismo sensacionalista, comprometido apenas com a captação de audiências, o que faz à custa da comoção emocional exagerada e que opera de forma manipuladora.
Se o jornalismo sensacionalista está presente nos meios de comunicação é porque há telespectadores para esse tipo de jornalismos…
Trabalho realizado por : Maria João Domingues